Marcelo Moutinho mostra, nos treze contos desta obra, a verdadeira linguagem que define a cidade do Rio de Janeiro. Daí ele se desviar dos clichês da cidade maravilhosa para privilegiar os espaços menos glamourizados que a constituem, detendo-se nas agruras, complexidades e delícias do cotidiano de seus habitantes. As experiências mais corriqueiras são, nesse sentido, convertidas em pequenos assombros e epifanias, graças a um olhar incisivo que não prescinde da força dos afetos. Tudo com densidade e leveza ao mesmo tempo.
A expressão do título, Rua de dentro, traz uma bem-vinda dubiedade. Rua de dentro é aquela que, na fala popular, não é a principal ("Vai pela principal? Não, vou pela rua de dentro"). Os personagens são igualmente típicos das "ruas de dentro": aqueles que não costumam estar sob os holofotes, nos espaços principais da cidade. Mas a expressão tem ainda um segundo sentido, ao evocar também as ruas que trazemos dentro de nós. Ou: como a experiência na vida coletiva, da rua, reverbera em nosso interior, nossas ruas íntimas.