Rotas de Fuga é um romance em que a diversidade de vozes narrativas, acrescida de uma linguagem na qual domina uma atmosfera de incertezas e de ambiguidades, justificam o estilo da narração. Tem como protagonista Helena, quem, na pretensão de escrever um romance, sentindo-se traída pela memória, busca auxílio em um narrador que a socorre quando do preenchimento dos seus vazios. Na condição de narradora depara-se com bloqueios que vão se insinuando no enredo e que por vezes a levam a interromper o
discurso. Como compensação à precariedade da sua memória recorre aos sonhos (?) — os maiores responsáveis pela citada ambiguidade — por lhe provocarem o despertar de uma memória ficcionada, desvinculada, na maior parte das vezes, da temporalidade. É quando o imaginário fica responsável pelo estado de encantamento em que costumeiramente se refugia. A presença de elementos autobiográficos desperta, em Helena, a memória íntima de um tempo; e é quando realidade e fantasia se confundem, cedendo lugar à imaginação — o que ocorre já no início da narrativa. Uma história que não se fecha onde a protagonista, na pretensão de realizar o sonho há muito acalentado — o de escrever um romance —, é surpreendida por situações que a despertam para o autoconhecimento. Perseguir um sonho, a partir daí, vai sendo suplantado pela necessidade de antes se conhecer — necessidade que não consegue satisfazer. Daí a história não se fechar, transferindo ao leitor parte da responsabilidade por também preencher os vazios com os quais venha a se deparar com a leitura do romance. Um leitor participativo e crítico, portanto, é para quem a narrativa se volta. Um leitor suficientemente esclarecido e capaz de fazer uso da imaginação a fim de dar fechamento ao enredo. E aí está, em parte, a originalidade do livro, bem como sua contemporaneidade.
Em síntese, o sonho de escrever um romance talvez não passe de uma camuflagem a ocultar, de Helena, o real motivo que a levou a narrar sua história: o da busca pelo seu papel cósmico, da sua inserção no mundo.
No desenrolar da narrativa a protagonista deixa entrever o quanto é
difícil escrever um romance.