Fome, desemprego, guerra, pandemia, crise climática, líderes autoritários... O mundo vive hoje muitas desventuras. E uma delas, não listada na primeira frase deste editorial, detém uma altíssima periculosidade, porque, além de não resolver os problemas anteriores, tem o potencial de agravá-los. Estamos falando do negacionismo. Esse comportamento não é novo no ser humano, mas, na vida contemporânea, ironicamente ultraconectada e com acesso facilitado e infinito a informações, tornou-se frequente e vem pautando sociedades e governos, abalando a confiança nas instituições científicas, democráticas e provocando, inclusive, mortes – como o movimento antivacina nas mídias digitais, que interferiu no combate ao Sars-Cov-2, sendo responsável por uma importante parcela dos óbitos pela Covid-19 no Brasil e no mundo.
Diante da urgência e gravidade do tema, a Continente deste mês traz reportagem que aborda a origem, as consequências e os aspectos do negacionismo. As repórteres especiais Débora Nascimento e Luciana Veras conversaram com especialistas que analisaram o comportamento, cuja palavra, no ano passado, foi dicionarizada pela Academia Brasileira de Letras e é analisado em dezenas de verbetes assinados por autores diversos, no Dicionário dos negacionismos no Brasil, lançado pela Cepe Editora.
A matéria também engloba o papel das redes sociais, dos gabinetes do ódio e das máquinas de fake news, que alimentam o negacionismo, baseado em ignorância e preconceito. "Nos grupos reacionários, você tem a radicalidade da extrema direita, o antiglobalismo, o negacionismo reforçado pela agenda conservadora de costumes e uma posição antigênero, antiLGBT, antidireitos sexuais e reprodutivos. O negacionismo é um vetor nesse conjunto, uma força a mais dando legitimidade a essa forma de pensar que é de uma parte da nossa sociedade já imersa num processo de fascistização", afirma o sociólogo José Szwako, coorganizador do Dicionário com José Luiz Ratton, destacando um dos aspectos dessa discussão de suma importância, principalmente em um ano de eleição presidencial determinante.