O livro que você tem em mãos não é sobre alimentação. Ele também não é um livro comum de receitas, pois carregado de memórias, afetos, histórias, amizades e sabores, ele é poesia em forma de saberes, afinal o verdadeiro sabor vai além dos temperos, ultrapassa o prato, a mesa, a cozinha, a casa e até mesmo o tempo para se instalar nas nossas mais ternas reminiscências.
Prova do que afirmo é o fato de que, afora as receitas, as crônicas que as antecedem são verdadeiros memoriais de família, mananciais tecidos sob o signo da sutileza, posto que no fundo mais fundo de cada um de nós, sabemos, esta matéria da qual somos compostos é um amálgama das circunstâncias pelas quais passamos.
Assim, podemos dizer, sem qualquer sombra de dúvida, que a matéria prima de “Receitas das nossas mães” é o amor, este mesmo que vemos refletir em cada palavra, em cada imagem, em cada receita escolhida para compor a obra, no cuidado com a edição e no projeto gráfico, de modo que o aparentemente invisível se faz presente sob diversas maneiras.
Não obstante, vale lembrar que o ato de se alimentar, primordial para a existência, é permeado de elementos simbólicos, como a seleção e predileção dos ingredientes, a criação culinária e a perpetuação de receitas, como aqui ocorre, até mesmo a construção de valores empregados ao ato de se reunir em torno da mesa numa espécie de comunhão ou liturgia. É por isto que neste livro o interesse pelo particular dá um tom universal às experiências que não apenas são vívidas, mas vividas, e assim, duradouras.
Tenho a sensação de que ler este livro, de maneira contemplativa, será uma experiência enriquecedora. Digo isto por mim, pois eu, que já tive a oportunidade de lê-lo por conta dos fins profissionais, agora o aguardo com a mesma ansiedade das autoras, saindo dos fornos da gráfica, agora para degustá-lo, página a página, textos e receitas que, seguramente, terão passagem pela minha cozinha, pois atualizando o dito popular, de cozinheiro e louco todo mundo tem um pouco. Eu também.
E assim, benditas sejam as mulheres que se empenharam na elaboração deste livro, todas as que deram suas ricas contribuições, o tempo gasto em pesquisas, em escritas e reescritas, para termos em mãos a maravilha que é “Receitas das nossas mães”, pois pressinto que tudo aqui foi feito para se ler, ou para se comer, agradecendo a Deus, ou como dizem os mais antigos, rezando.
Gustavo Felicíssimo
Cozinheiro da família,
escritor e editor na Mondrongo"