Partindo de perspectivas xamânicas sobre as artes da cena e de performances poético-corporais, Henrique Guimarães descreve e analisa vivências coletivas que desenvolveu em seu estágio-docência na UNIRIO e, também, a rotina das práticas de si que realizou na região do Cariri (Ceará), na reserva florestal da Chapada do Araripe, abrindo-se para os planos invisíveis da experiência e da natureza, por meio do uso de plantas de cura e poder. Entre as muitas particularidades do universo do pajé – pleno de copresenças, acoplamentos, traduções, transduções, políticas cósmicas –, uma, em especial, foi muito bem incorporada pelo autor, a expressividade polienunciada, magnificada de alteridades, que gerou uma variegada produção de cartas na última parte de seu estudo. Ao superpor ao discurso ensaístico-acadêmico a virtualidade de vozes-espíritos – algumas dessas cartas são endereçadas, inclusive, a duplos-pessoas da ayahuasca, da erva-mate, da sananga, do tabaco, agentes psicoativos da medicina ritual –, Henrique impregna a escrita de "performagia", traz a oralidade vivencial-relacional onírico-especulativa do pajé para o âmbito gráfico-espacial do livro. O texto agora publicado, inicialmente tese de doutorado desenvolvida no Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas da UNIRIO, cumpre, por essa e outras razões, a missão xamânica de estabelecer relações de predação, retaliação ou aliança, ao interagir com os seres-imagens presentes no espaço do "caosmos" da cultura ocidental. André Gardel