O livro Política britânica no Rio da Prata é um clássico argentino que agora aparece por vez primeira em português. É também o principal livro de Raul Scalabrini Ortiz – o primeiro dele publicado em nosso país – um engenheiro de formação que decidiu dedicar-se aos assuntos de sua pátria num momento crucial da vida argentina: o amplo domínio que os britânicos exerceram sobre a vida econômica, política e cultural da nação vizinha. Em perspectiva podemos afirmar que nada poderia ter sido feito na Argentina sem a aguda perspectiva analítica inaugurada por este luminoso livro. A esquerda nacional argentina deve à ele quase tudo. Nada passou sem sua aguda percepção: a miséria do liberalismo em nossas terras, a incapacidade da classe dominante argentina em encabeçar uma grande transformação nacional, a cumplicidade da imprensa de seu país com os interesses do imperialismo, os movimentos da diplomacia britânica no terreno econômico, cultural, político e seu profundo impacto na opinião pública de nossos países, entre outros temas relevantes. A consciência anti-imperialista ganhou força a partir de seus estudos e desde então muitos outros adotaram o saudável e potente hábito intelectual de dedicar-se aos nossos problemas como caminho seguro – e único – de produção intelectual e relação com o vasto mundo em que vivemos.
Política britânica no Rio da Prata é um destes livros proibidos pelo academicismo universitário, ambiente sempre aberto às modas necessariamente passageiras oriundas dos Estados Unidos e da Europa e completamente hermético aos estudos críticos escritos por latino-americanos, desde as entranhas de nossa Pátria Grande. Fazer-se escritor crítico e um homem de ação, no ambiente colonial então dominante, não é tarefa para qualquer pessoa. Jorge Luis Borges, num texto tão genial quanto convenientemente esquecido (pelo próprio autor inclusive), afirmou na década em que Raul enfrentou o neo-colonialismo britânico e seus muitos representantes acadêmicos, que a realidade argentina era vital, enquanto a realidade pensada era mendiga. Com Política britânica no Rio da Prata podemos afirmar que também a realidade pensada argentina deixou de ser mendiga. Para nossa sorte comum."