Quem podia imaginar que em pleno século XXI, era da modernidade e da vida a crédito, ainda sobreviveria, em Juazeiro do Norte, um grupo de penitentes que insiste em segurar o passado com as mesmas mãos que seguram os rosários? Essa questão é o fio condutor do trabalho de Roberto Viana, jovem historiador que já demonstra um olhar aguçado sobre o cotidiano e sobre as artes de fazer dos sujeitos que o inventam.
Atraído pela alegórica figura de um penitente vestido de azul que bradava em inflexão de pregação durante as romarias de Juazeiro do Norte, Roberto inquietou-se com o tom dos sermões proferidos pelo penitente João José Aves de Jesus. Ali estavam presentes diversos elementos religiosos – artes de bem morrer, castigos divinos, pragas e pestes, fim do mundo –, que coadunavam com o sentimento de medo que a Igreja Católica propagou durante séculos enquanto estratégia de controle das almas e corpos de seus fiéis.
Ao escolher investigar as tramas existentes na fala do penitente, Roberto abriu as portas de um universo religioso único e até então, inescrutável. A narrativa cuidadosa apresentada aqui traz à tona a história dos Penitentes Peregrinos Públicos, único título aceito e ratificado por eles, e se preocupa em desconstruir estigmas e reconstruir trajetórias de santidade, ressignificadas pelos homens e mulheres penitentes do Cariri.