Eu estava no colegial e deveria ter uns 16 anos quando a professora de português chegou com um título inusitado para uma prova de redação: "O ovo quebrou". Imaginei uma casa com três janelas que davam para um terreiro de onde se podia observar uma galinha que acabara de botar ovos. Não me lembro o que inventei na época, mas um dos ovos se quebrara. Em cada uma das janelas estava um membro de uma família presenciando a mesma cena; na primeira o pai, na segunda a mãe e na terceira a filha adolescente. Cada uma dessas pessoas teve uma reação diferente à quebra do ovo! O pai pensou no prejuízo porque comerciava os ovos; a mãe, em uma receita qualquer; e a filha associou o ovo quebrado aos seus sonhos não realizados. Curioso é que essa redação, escrita há muitos anos, ficou na minha mente e me inspirou a escrever este livro, que também conta a história de uma família, cujos membros têm cada um uma reação diferente a um acontecimento inesperado. Mas este romance fala essencialmente sobre desejos, e procura questionar em que medida os desejos dos nossos pais contaminam os nossos. Muito já ouvimos falar que, para podermos viver uma vida mais plena, precisamos cometer um matricídio "mental", ou seja, matar a mãe por nós interiorizada, ou um "parricídio", quando se trata do nosso pai. Cada núcleo familiar possui seu traço peculiar, sua dinâmica, sua lei, e perceber-nos inseridos nesse contexto é o primeiro passo para o autoconhecimento, acredito eu.