Houve uma época em que um jovem planeta vagava pelo céu, descrevendo órbitas ao redor de um maravilhoso Sol azulado, que lançava seu brilho intenso em meio a uma constelação ainda desconhecida para nós, apesar de todos os poderosos telescópios que possuímos atualmente. Pois o tal planeta era lindo - um pouco menor que o nosso - e isso foi há tanto tempo, mas tanto tempo, que nem mesmo o Sistema Solar que habitamos existia ainda. Sim, ainda não existiam a Terra e a Lua, nem Marte, Júpiter, Saturno... nenhum deles. Nosso próprio Sol não passava de uma ideia guardada na mente de Deus, esperando pelas poderosas forças que o criariam. Pois o planetinha lá estava, prontinho, com seus mares, rios, montanhas, florestas e desertos. Tudo certinho, em cada detalhe. A atmosfera que o cercava era azulada como o nossa, abrigando nuvens que iam para lá e para cá, ao sabor dos ventos suaves que refrescavam o solo. Tudo era puro, limpo, bem organizado. A natureza estava em equilíbrio. Pois foi ali, nesse cenário de beleza e paz, que X abriu seus olhinhos pela primeira vez. E quem, ou o que, era X? Pensando bem, acho que nem mesmo ele sabia quem era, pois quando olhou ao seu redor, ainda meio estonteado, não viu ninguém nas proximidades. Não sentiu medo ou solidão, pois ainda não conhecia esses sentimentos, e tudo era perfeito demais, agradável demais, confortável demais. Parecia que o planeta o abraçava, feliz pela sua chegada, como uma mãe carinhosa o faria com seu primeiro filho recém-nascido. E assim viveu, confortavelmente, durante muito e muito tempo. Não tinha necessidades. Como por milagre, tudo lhe era concedido, bastando um simples pensamento ou desejo seu. Desconhecia o que era fome, sede, frio ou calor. Nenhuma doença o atingia, nada o incomodava. Por ele, viveria ali para sempre. E assim, X cresceu, forte e saudável, repleto de energia. Até então, não sentira falta de companhia. Ele mesmo se bastava. Brincava com animais que o procuravam e que pareciam divertir-se imensamente com sua presença. Alguns eram grandes, cobertos por longos pelos, caminhando sobre quatro pernas e com um curioso apêndice no final das costas. X os cavalgava, correndo pelos campos, sem medo de cair, pois a relva macia que se espalhava por toda parte amorteceria qualquer choque com o solo. A maioria, porém, era de pequeno tamanho e de uma variedade infinita de formas e cores. Esses eram os mais divertidos. Pulavam sobre ele, lambiam-lhe o rosto e corriam para lá e para cá, sempre alegres e brincalhões. Alguns, cobertos de penas, pousavam sobre seus ombros e entoavam cantos maravilhosos, que costumavam embalá-lo até o sono. Anos e anos passaram-se nessa deliciosa rotina. Mas a curiosidade, aos poucos, tomava conta dele. Algo em seu interior começara a levantar questões para as quais não tinha resposta: "Quem sou eu?" "O que estou fazendo aqui?" "Que lugar é este?" "Estou sozinho aqui?" "O que é essa angústia que às vezes me deixa inquieto, apesar de tudo o que possuo?" E assim por diante. Eram tantas perguntas que chegavam a deixá-lo tonto. Foi assim que, um dia, resolveu partir. Tinha crescido, seus músculos brilhavam sob a pele e ele se sentia pleno de coragem e energia. Definitivamente, estava pronto para a grande aventura que o esperava. Um dia, ao nascer do sol, X levantou-se, banhou-se no rio tão conhecido seu e resolveu começar a caminhar. Bastou um segundo de reflexão para decidir a direção que tomaria: acompanharia o curso da água ao seu lado, no sentido em que ela corria. Pelo menos, sabia que não sentiria sede. Como nada possuía, não se preocupou em levar o que quer que fosse. Confiava nas forças que sempre o haviam sustentado e protegido. Os primeiros passos foram acompanhados por uma enorme quantidade de animais, que pareciam chorar pela sua despedida. As melodias dos pássaros nunca soaram tão tristes. Em poucas horas, ele ficou só.