O chocolate já esfriou na xícara, e Gabriel não tomou um gole sequer. Com o olhar ainda preso ao jornal, percebe que aquele vazio de outros tempos começa invadir-lhe o peito. Talvez seja apenas por influência da reportagem com Ortega em seus dias de cativeiro. Talvez não, pois sabe muito bem que esse sentimento costuma aparecer-lhe a qualquer hora, como um telefonema que não se espera. A mão preguiçosa leva a caneta ao canto superior do jornal onde escreve:
Não existo para os olhos que me veem agora
O que ainda em mim reluz
É apenas a extensão da luz
Que já se apagou outrora.