O mundo contemporâneo é o do exílio e não o da pátria, o da errância e não o do lugar. Razão pela qual nosso tempo foi denominado de "século breve", em que os acontecimentos e os desaparecimentos de modos de vida e valores são acelerados, não permitindo o repouso para constituição de uma memória reparadora. Exílio, expatriamento e dispersão espacial são, pois, o emblema das migrações forçadas por guerras, perseguições políticas e diferentes formas de conflito, que produzem a "nostalgia do inteiramente outro" diante da "vida mutilada". Assim, a diferença entre duas figuras: a da viagem e a da partida, a odisseia e o êxodo, uma que vive no horizonte de um retorno, outra que anseia por uma pátria que não existe mais. A viagem contemporânea para uma terra de exílio tem algo de enigmático, pois populações inteiras atravessam os mares, assombradas pelos naufrágios e pela incerteza da chegada ou do encontro de um não lugar.
Herdeiro problemático de um duplo trauma – o do extermínio dos judeus europeus durante o nazismo e, simultaneamente, o da expulsão dos palestinos de sua terra com a criação do Estado de Israel – Edward Saïd, um dos mais importantes intelectuais palestinos, refletiu sobre a questão da identidade em situações de exílio e estranhamento cultural, procedendo a uma genealogia do sentimento de desorientação, desrealização e perda de si que o exílio produz. Pois se, antes, cada um de nós tem o conforto de paisagens conhecidas, o aconchego do mundo entre os seus, o país estrangeiro representa a passagem do conhecido ao desconhecido, significa o enfrentamento de um incerto acolhimento, com incompreensões, desprezo e hostilidade do lugar a que se chegou. Reunindo, assim, sua formação de scholar em literatura nos Estados Unidos e de musicólogo e pensador geopolítico, Edward Saïd refletiu sobre a construção de um Oriente pelo Ocidente, pelo medium de escritores nos quais há a personagem fantasmada do Outro