Desde que conheci Brasileiro em 1999 na Secretaria de Estado de Direitos Humanos, onde trabalhamos juntos durante alguns anos, pensei que a sua história daria um livro bem interessante. E isso porque eu sabia muito pouco sobre ele, somente que era um ex-presidiário. Mas dava pra ver que ele era um personagem rico e extremamente espirituoso, cheio de carisma e com um extraordinário senso de humor, o que fazia todo mundo rir a todo instante, pelas situações mais diferentes que surgiam no dia a dia daquela repartição pública tão movimentada e atuante àquela época.
Entretanto, eu não podia imaginar quão rica era a sua história.
A sua trajetória de vida nos apresenta um verdadeiro panorama de todas as facetas que um ser humano pode vivenciar, envolvendo um número tão variado, quanto complexo de pessoas de todas as classes, culturas, níveis de educação e, sobretudo, níveis de consciência.
À medida que ele foi me relatando suas experiências, fui descobrindo um mundo inacreditável de tanta força e crueza, momentos de horror e miséria, como atos de grandeza, sublime espírito de perdão e puro amor. A que níveis de degradação e baixeza se pode chegar e a que graus de tão elevado altruísmo e abnegação pode alçar o espírito humano! Como podem apresentar tão diferentes faces? Como podem cometer atos tão vis e perversos e mesmo assim continuarem entes humanos? E por que outros tantos, sendo tão simples e tendo vivido situações sociais análogas, podem apresentar exemplo de tanta sabedoria e generosidade?
Na verdade, aprendi muito com essa experiência. Aprendi com cada personagem que aparece nas suas narrativas, como nos contatos que tive oportunidade de estabelecer. E o que pude constatar foi que as minhas convicções sobre os Direitos Humanos se reforçaram ainda mais. Pude comprovar o que pode ser mais importante para a nossa compreensão da natureza humana, que é o fato de que cada pessoa está em constante evolução e cada ato que pratica, seja o mais i+A8:T58gnóbil ou abjeto, não lhe tira nem diminui a sua condição humana. Pelo contrário, o habilita a aprender, seja pelo castigo imposto pelas leis, ou pelas conseqüências de suas ações em sua vida pessoal e em toda a sociedade. Vai aprender e vai se transformar. Essa transformação, entretanto, para que se efetue de maneira conduzida e programada, e nesse caso, pelo Sistema Penitenciário, demanda algumas pré-condições. Não será com a tortura, nem com o ódio, mas com educação, cultura, disciplina e respeito humano. Religião também é importante, mas sem fanatismo e sem prejudicar a capacidade de avaliação e crítica isenta da realidade. Tratamento psicológico e assistência social são imprescindíveis e mais adiante capacitação profissional e emprego.
É maravilhoso observar o processo de transformação de um ser humano, emergindo do caos moral a um estado de compreensão de si e de sua condição e partir daí para uma mudança de atitude perante a vida e a sociedade, começando lá de baixo, para se resgatar como cidadão.
Não quero me alongar mais nesta apresentação, mas vale dizer que a lição mais importante de toda essa história é que a que nos passa Dona Celina, como tantas outras sofridas mães– a lição do amor incondicional.