Dias Gomes trata do heroísmo como objeto de comércio nesta nova edição de O berço do herói, peça que deu origem à novela da Rede Globo, Roque Santeiro.
Cabo Jorge, morto na Itália como pracinha da Força Expedicionária Brasileira, se tornou herói em sua cidade natal. Bravo diante do inimigo nazista, pagou com a vida o direito de ser livre. Soldado da democracia, encheu de orgulho o coração da pátria amada.
Sua cidade, modesta e perdida no remoto interior do país, adotou o nome de Cabo Jorge e passou a ser um centro turístico. As datas de seu nascimento e de sua morte eram pontos comemorados do calendário cívico de todas as escolas do Brasil. Porém, surpreendentemente, o militar reaparece na cidade, vivo e são, como se tudo não passasse de uma grande gozação. Fora ferido em combate e, para não fugir à verdade, fugira da luta. Desertara.
Começa, então, o drama: os beneficiários de seu pretenso heroísmo não podem aceitar que a sobrevivência insólita e inoportuna destrua todo um esquema de exploração comercial do mito. Como admitir que Cabo Jorge (o cabo) arruinasse o comércio e a indústria de Cabo Jorge (a cidade)?
O berço do herói é uma comédia política onde o mito do heroísmo vai pelos ares depois de examinado pelo autor à luz dos interesses da classe dominante brasileira.