À noite, o bombardeio lança sobre esquinas inteiras da cidade as dilacerações de seus obuses, o terror de sua matança anônima; de dia, espreita-se em vão as profundezas nevadas do céu à espera do voo de um pombo correio que traga sob suas asas o anúncio de, ao menos, uma vitória longínqua, uma informação, ainda que vaga, sobre o que se passa com os parentes distantes na província que se imagina devastada, presa de todos os horrores. Mas os balões saem todo dia levando cartas eternamente sem resposta. O frio, a geada, as balas prussianas terrivelmente certeiras tornam cada vez mais raros os retornos dos torcazes aos pombais, e a sede de notícias é tão grande, a ansiedade tal, que se compram três, quatro jornais em vinte e quatro horas. Todos se repetem; entretanto, quando um vendedor passa gritando: "Vejam as últimas notícias, detalhes precisos do ataque", cabeças aparecem nas janelas embaçadas das casas, os apelos reverberam, mulheres, crianças descem, dão seu sou e, de pé, na rua, leem a folha impressa, febrilmente. A folha repete o que a folha precedente contou, reproduz as mesmas informações, copia os mesmos despachos e, entretanto, dali a pouco, correrão à porta das subprefeituras, vasculhando nos gradis de ferro, onde se colam os avisos administrativos, a esmola de não se sabe qual oficial que seria uma notícia. A esperança abandonou de tal modo os corações que não se conta mais com o anúncio de um sucesso: pede-se apenas uma mudança de tédio.
Henry Céard – A sangria.