"Viver como um estoico Durante aproximadamente um ano, dediquei longos períodos para a releitura das obras de três autores que sempre estiveram presentes em meu dia a dia. Sêneca, preceptor de Nero e brilhante orador romano; Epicteto, ex-escravo e detentor de um saber que
lhe devolveu a liberdade; e Marco Aurélio, imperador e filósofo.
Todos viveram no início da era cristã. Suas lições pairam sobre nós há quase dois mil anos. É assimilando o que disseram, tentando colocar em prática seus ensinamentos, que tenho pautado minhas ações desde então. A um primeiro olhar, acredita-se que estão à nossa disposição com facilidade. Nada mais enganoso. Isso exige uma disciplina e uma contenção que poucos parecem dispostos a inserir em seu cotidiano. A serenidade, pilar central de seus discursos, tem sido algo com que apenas sonhamos, uma espécie de reserva moral para a provecta idade. Por enquanto, parece-nos mais relevante vasculhar as minúsculas e prosaicas ações cotidianas. E o que era um propósito tornou-se frustração
mal digerida.
Há também o princípio da contenção. A capacidade de observar o que acontece ao nosso redor, deixando de mergulhar nessa teia vertiginosa que nos enreda e distancia do que realmente é importante: sentir-se em paz; olhar do alto, sem ser tocado demasiadamente pelas circunstâncias. Pertence ao homem sábio o intento de afastar-se do que o perturba. A decisão de optar pelo que lhe trará felicidade pode ser uma escolha pessoal. Você se lembra da última vez que fez isso? Não há necessidade de se viver isolado para obter esse ideal. Aliás, será muito mais nobre
se o fizer em meio ao burburinho, testando sua aptidão de criar um espaço interior em que se é capaz de permanecer incólume.
Poucas coisas são mais difíceis de serem atingidas, pois somos convidados constantemente a prestar atenção ao que é periférico e destinado ao esquecimento. Para alcançá-lo, medito – é o melhor exercício para a depuração da alma. Quero me tornar um ser humano mais tolerante, sabendo aproveitar de maneira inteligente essa competência que nos foi dada de sair da vida sem bagagens, carregando apenas algumas lembranças. É na
observância dessa finalidade que tenho me nutrido. E escrito este livro.
Olho para o trabalho realizado – este pequeno jardim – e constato: sou um homem que carrega no colo a alegria.
Gilmar Marcílio"