Se a Idade Média pode ser considerada a idade das crenças e o século XVIII, a idade das luzes, o século XX é marcado pela descrença e o apagar dessas luzes pela ascensão de luzes muito mais poderosas e claras, porém, cegantes também. A cegueira assumiu lugar definitivo na mente humana, pois ela tornou-se a própria mente humana. Quando me refiro que este é o século da descrença, afirmo toda a decepção do homem moderno com a razão, sobremaneira, depois de Auschwitz. A razão mostrou todo seu potencial destrutivo, de modo que impedir atrocidades, passou a ser uma espécie de bandeira para os seres humanos, todos muito atentos, como Heráclito e sua lanterna à luz do dia. A cegueira foi, portanto, a mistura de luzes do deslumbramento com a razão, abandonando por completo o direito, os direitos humanos e a soberania do valor de cada indivíduo, pois se foi o século da individualidade, ao mesmo tempo, podemos deferi-lo como o século da solidão. Nada antitético até aqui, pois quanto mais indivíduos somos, menos nos parecemos com os outros e mais nos tornamos o espelho de nós mesmos e, portanto, mais solitários.