Os 16 contos que compõem "Está tudo bem, querido?" apresentam um protagonista chamado, como seu autor, Ricardo Morales. Os pontos de vista - que partem da primeira e da terceira pessoa -, além de diversos contextos e cenários, deixam claro que não se trata de um único personagem em diferentes fases da vida: o que existe é uma pulsão, talvez inédita na literatura brasileira, das múltiplas faces de um autor.
O que os vários Ricardo Morales têm em comum entre si é uma espécie de sentimento de inadequação: caminham cabisbaixos pelos subúrbios, vêm de lares sufocantes, levam uma existência tortuosa e distante de qualquer idílio de felicidade. Mulheres, traição, bebidas, sexo e dinheiro (ou a falta dele) são temas recorrentes.
É impossível não perceber o tom aflitivo, quase claustrofóbico, de todos os contos. Com descrições exatas e nada poéticas do existir solitário, do existir melancólico e do existir irrefletido, "Está tudo bem, querido?" evoca tanto o que é visível quanto o que está na sombra.
Esqueça as firulas e os rodeios: o que Morales apresenta nestes contos é o poder da prosa seca, da dor intensa - a frustração debaixo do tapete da sala, o desânimo diante do desemprego e da pilha de louça suja. A apatia da rotina conjugal contrasta com uma fúria contida, algo que parece estar sempre pronto para explodir. Definitivamente, não está tudo bem.