O livro é intitulado por "Enquanto a lágrima não vem- diário de uma mulher quase sem memórias", pois oferece a representatividade do corpo, dos anseios, da alma e da psiquê de uma mulher, que possui um diagnóstico raríssimo de Alzheimer precoce. O texto é iniciado com os tormentos e afetações da personagem no momento em que tem consciência de sua realidade. Percebemos que, ao narrar, Xico se reveste por um eu- lírico muito sensível e sedutor na intenção de dialogar sorrateiramente com a essência dos instintos femininos da personagem, escancarando segredos, inquietudes, desejos e reflexões.
Para poder se localizar e se restaurar em meio ao caos que se transformou os seus dias, Estela escreve um diário. Uma espécie de confessionário. Um recurso mais do que poético pra que ela pudesse se comunicar com mais íntimo dela mesma. As suas lembranças se aglomeraram numa bagunça tão grande, que o texto vai exigindo outros narradores para mediar a trama de uma lágrima, que está por cair. Uma lágrima que só despenca depois de toda uma tempestade.
Para isso, o autor criou três camadas narrativas que perpassam toda a tormenta experimentada pela protagonista. São três narradores tentando dizer o indizível, tentando retomar as lembranças de um alguém que já se perdeu em sua não- palavra. Alguém que se abreviou em siglas, sem, ao menos, entender ou subentender o seu verdadeiro nome.
Depois dessa intimidade toda com a psiquê da personagem, Xico nos toma a palavra, falando por nós, por meio do processo de reconstrução de Estela. Ele vai esmiuçando as palavras daquilo que nos representa dentro da experiência do sentir a vida e de tomá- la com todas forças em nossos braços, porque, ao menos, pelos braços, ela não nos escapará, mas pelas lembranças será sempre uma grande incógnita.