Um grupo de militantes e jovens universitários, em meio a frequentadores diversos, reunidos para discutir pedagogias libertárias em rodas de conversas quinzenais: é esse o conteúdo em forma de um despretensioso diário de campo que é apresentado ao leitor nas páginas que se seguem. Por outro lado, não é fácil definir o perfil de todos que, eventualmente, frequentaram as nossas rodas durante o ano de 2014. Afinal, ela funcionou de forma bastante livre, como convém a um espaço compartilhado por anarquistas, ou, se não exatamente anarquistas em sua totalidade, pelo menos, por pessoas que praticavam a gestão horizontal nos debates. Talvez seja mais fácil falar sobre como funcionava a roda para dar uma imagem mais refinada do que lá acontecia. Ela funcionava de forma aberta, talvez a única regra realmente presente em todos os encontros foi a que preservava a vez de falar: com o dedo erguido cada um se "inscrevia" em sua vez de participar nas conversas. Pessoas entravam e saíam, dois ou três se mantiveram frequentes ao longo do ano, e muito se planejou, esboçou, conversou e se compartilhou naquelas rodas de domingo à tarde. Tento passar um pouco disso tudo nos relatos que se seguem. Como verão, alguns nomes aparecem uma ou duas vezes. Outros, pelo contrário, afirmam-se presentes constantemente, e podem se tornar familiares ao leitor. Acredito que aqui não devo induzir o leitor a destacar esse ou aquele, uma vez que a roda, ao se abrir novamente através deste livro, será uma experiência do leitor com o que puder ser marcante para ele. Outro ponto que é difícil definir é o fato deste livro trazer um material que não foi escrito nem planejado para ser publicado. A essa questão já bastante controvertida entre pesquisadores – especialmente os antropólogos -, emendo uma segunda: afinal, qual a relevância de agora publicar essas notas? Tentando responder a primeira questão, não a respondendo com uma sequência de novas indagações, acredito que retomar as anotações trouxe problemas práticos como: até que ponto revisar ou alterar o texto original das "cadernetas"? O que cortar? Como não descaracterizar o que foi observado e como não ficar apenas nos relatos, condenando assim todo o conteúdo pesquisado? O que posso dizer é que tentei interferir o mínimo possível para não perder certo viço do que ficou gravado, por acreditar que há também uma questão de estilo sobre a qual se debruçar. Sei que corro o risco de parecer presunçoso ao publicar essas notas. Mas espero que realmente há bons motivo para assumir tal risco. Somente os outros poderão julgá-los. Algumas informações incompletas ou elipses diversas não foram retiradas do texto, porque se trata de uma escolha: deixar em destaque a quantidade de informações nas quais mergulhamos e a complexidade de se tentar abarcar os fenômenos que nos afetam. Um diário de campo não é todo planificado, na verdade se trata de uma escrita ainda em processo. Trata-se, sobretudo, de desnudar os desafios da pesquisa de campo e todo o processo da produção do conhecimento, ainda que sob condições polissêmicas ao extremo, sobretudo por se tratar de um espaço aberto, com diversas entradas e saídas de frequentadores, alguns deles pessoas de passagem na ocupação e na cidade, tendo em vista que lá também funcionava uma hospedagem solidária, além dos habituais moradores de rua que para lá se dirigiam. Quanto a segunda questão, posso afirmar que os registros de um diário de campo têm suas qualidades: o texto fresco das anotações, acredito ser um material que possa interessar aos professores, estudantes e interessados em geral pelos campos da educação. É esse estilo despretensioso, às vezes atropelado ou mesmo em tom de puro desabafo, que parece fazer valer à pena me arriscar.