Esta etnografia parte das tensões envolvidas no processo de remoção do mercado de rua do centro de Porto Alegre/RS e sua realocação para um shopping popular. O "camelódromo", como ficou conhecido o edifício que abriga mais de 800 lojas – de aproximadamente 4m² –, foi realizado em tempo recorde graças a uma Parceria Público Privada (PPP), a primeira do gênero em Porto Alegre e uma das pioneiras no Brasil. A dissertação privilegia a abordagem etnográfica, baseada numa inserção de campo de mais de três anos, o que permitiu captar o processo em perspectiva diacrônica. A observação participante – acrescida de outras técnicas, como entrevistas em profundidade e surveys – teve como ponto de partida um dos principais grupos de camelôs envolvidos na transição. Este grupo, inicialmente otimista em relação à transição, foi preterido na disputa pelos melhores espaços no camelódromo e reagiu com uma série de mobilizações. Foram acionadas diversas instituições políticas, tais como a Câmara Municipal, o Ministério Público, a Prefeitura, e o Orçamento Participativo, entre outras. As tensões não cessaram, pois a transição das ruas para o camelódromo foi acompanhada de perto pela empresa, que exigiu uma mudança na sensibilidade comercial, a partir de uma política de pedagogização visando forjar um novo perfil de comerciante, indispensável ao sucesso econômico do empreendimento. Novas modalidades de conflitos emergiram dessa estratégia, pois nem todos os camelôs se reconverteram no protótipo de lojista idealizado pela PPP. As tensões em torno desse processo criaram um cenário propício para uma investigação que se preocupa em reconstituir etnograficamente os nexos entre a economia e a política, o objetivo e o subjetivo, o micro e o macro, a cidade e os cidadãos, a diversidade de agentes e de agências que caracterizam uma dada configuração social e cultural.