A ideia mais difundida de um crime contra o Estado Democrático de Direito envolve a tomada do poder através da violência, da força armada. O governo é tomado de forma exógena, de fora para dentro, explosiva, através de revoluções, golpes e insurreições, sejam militares ou civis. Este crime, porém, pode ser concretizado de uma forma mais sutil, endógena, de dentro para fora, implosiva: através do voto. Nesta modalidade, o poder não é conquistado como um troféu de guerra, através do uso da força armada, e sim entregue de bom grado, por um povo seduzido, a uma casta revolucionária sorrateira. Esta casta, construindo com frieza o processo de tomada do poder, primeiro se aproxima das camadas populares, depois propagandeia ideais líricos de igualdade e liberdade, para depois apoderar-se destas bandeiras como seu único e legítimo porta-voz e, por fim, conseguir tornar o governo pelo voto popular. Uma vez eleita, esta casta cuida de aparelhar ao máximo as instituições vigentes, preferencialmente as que possuam maior poder decisório com menos servidores, o que facilita o aparelhamento. Cumprida esta etapa, a casta finalmente concretiza a tomada do poder em suas mãos, num tipo de "golpe branco", onde a ação golpista está blindada pela aparente legalidade de seus atos. Nota-se, então, dois tipos de crime contra a democracia: um nada sutil, armado, com violência, civil ou militar, e outro, sutil, sorrateiro, que se utiliza da própria democracia para solapá-la, através de um discurso cheio de humanidade que confere votos para, alçado ao poder, aparelhar o Estado e perpetuar-se como seu governante.