A parte introdutória desta obra coletiva fica a cargo da Professora da Faculdade
de Direito de Coimbra, Mafalda Miranda Barbosa, com o artigo versando sobre
"Coronavírus: a responsabilidade na experiência europeia – o caso Português". A
autora principia em uma bipartição quanto às projeções negativa e positiva ao nível
da responsabilidade civil. No aspecto negativo a covid-19 pode conduzir a uma exclusão
da responsabilidade contratual, seja diante da força maior (impossibilidade
de cumprimento não imputável ao devedor) ou nas situações em que, não havendo
impossibilidade, o instituto da alteração superveniente das circunstâncias torna-se
operante. Positivamente, a covid-19 poderá alicerçar uma pretensão indenizatória
no plano da responsabilidade extracontratual. O texto incita à reflexão sobre a
multiplicidade e complexidade dos problemas que a covid-19 faz surgir em sede de
responsabilidade civil, pela própria complexidade da realidade e da necessidade de
articular as especificidades dos casos concretos com uma dogmática exigente como
é a delitual. Nessa medida, impõe-se uma meditação apurada sobre a temática, aos
mais variados níveis. Compete à doutrina cumprir a sua missão.
Abrindo a seção sobre responsabilidade contratual, Nelson Rosenvald, por sua
vez, analisa o impacto do Coronavírus em relação aos Contratos Internacionais. Começa
por estudar o contrato como alocação de riscos, afirmando que todos os sistemas
jurídicos modernos enfatizam que de certa forma um contrato é "agreement". Após,
conceitua força maior e demonstra, brevemente, a importância atribuída as cláusulas
de "notice of readiness" (NOR), "cancelation rights", "laytime" e "demurrage" nos
contratos internacionais. Na sequência, ressalta que o sistema da common law parte
da premissa de que "contract is for the parties, not for the courts", ao contrário do
que ocorre na maior parte das jurisdições da civil law, não comungando, portanto,
com a ideia de que os juízes podem intervir no contrato para adequá-lo à alteração
das circunstâncias que rompem a sua base objetiva. Por fim, demonstra que a possibilidade
de diferentes tratamentos jurídicos para a inserção da pandemia como causa
de impossibilidade (força maior) ou alteração de circunstâncias (hardship) é apenas
um palco para a exposição das amplas divergências na compreensão conceitual do
que seja um contrato e de sua função social em cada um dos sistemas que analisa.
Carlos Edison do Rêgo Monteiro Filho aborda o conceito de força maior e seus
limites de aplicação. Sugere que, no plano jurídico, a administração dos efeitos da
crise mundial impõe pauta de solidariedade e altruísmo. Sobre os instrumentos de
distribuição de riscos, o autor trata da cláusula de hardship, a cláusula resolutiva
expressa e a cláusula limitativa ou excludente de responsabilidade demonstrando de
que forma cada uma apresenta solução própria para a hipótese de efetivação de riscos
supervenientes que dificultem ou impossibilitem a execução do contrato. Por fim,
após abordar a alocação de riscos, conclui que esta não se dá ao alvedrio absoluto das
partes, devendo sempre ser interpretada à luz da Constituição Federal. Assim, conclui
que, para as demandas em que se discuta a configuração da força maior e seus limites,
deverá construir sua convicção sobre a invocação da dirimente atento aos diferentes
graus de impossibilidade da prestação, em função das circunstâncias e fatores que
incidem, em concreto, na relação negocial em análise, à luz das previsões de seu
próprio regulamento de interesses e dos valores do ordenamento jurídico brasileiro.
Sílvio e Salvo Venosa e Roberta Densa exploram o tema da configuração da mora
em tempos de pandemia.