Contra Alheias Terras, do diplomata Carlos Mendes Valença, compreensivelmente publicando sob pseudônimo, descreve esta carreira de uma maneira que, podemos arriscar dizer, ainda não havia sido explorada na literatura brasileira. Relatando os bastidores pouco conhecidos de uma embaixada do Brasil no exterior, a obra é desconcertante em vários aspectos. Belamente estruturado em frases longas, que nos deliciam da mesma forma com que um cineasta nos brinda com um plano-sequência, Contra Alheias Terras se vale não apenas da prosa ágil e rico vocabulário, mas também de uma contínua ironia para retratar, na vertente de um Lima Barreto, um Machado de Assis ou um Nelson Rodrigues, a face comezinha e risível do serviço público. A decepção com a rotina de trabalho prosaica, a burocracia kafkiana que beira a alucinação, a aspereza das relações hierárquicas dentro do corpo diplomático, as negociatas em torno de promoções e remoções, a inveja e a violência (tanto a institucional, quanto a praticada pelos personagens) são mostradas de forma tão divertida quanto contundente. O leitor perceberá, contudo, que a obra não se resume a um mero exercício de inconfidência. Ao falar de como nossos diplomatas, teoricamente educados e treinados para suas funções, percebem e se relacionam com os países vizinhos e o seu entorno, Contra Alheias Terras, de Carlos Mendes Valença, nos convida a refletir sobre como nós, brasileiros, nos vemos, sobre o que pensamos que somos e sobre o que almejamos para nós como povo e nação.