"A pandemia da Covid-19 trouxe o inimaginável para o nosso dia-a-dia, nos afastou daqueles que amamos, nos tirou do nosso espaço de trabalho, desorganizou a economia, devastou famílias e escancarou as desigualdades sociais do nosso país. O início da quarentena foi tomado por posts de celebridades e influenciadores confinados em suas mansões usando a hashtag #estamostodosjuntosnessa. Mas não estávamos. E, justamente por isso, a pandemia da Covid-19 foi também tomada por manifestações, ativismo digital, cancelamentos e, claro, consumo de ativismo.
Os anos de 2020 e 2021 também trouxeram uma nova questão para as pesquisas em comunicação digital e blogueiras de moda – campo de estudos ao qual me filio: deveriam os influenciadores digitais se posicionar? Na verdade, não se tratava de uma indagação, mas de uma reivindicação: os seguidores passaram a exigir que blogueiras de moda, influenciadores, creators, tiktokers, youtubers – ou o termo vigente da época – se posicionassem em suas próprias redes sociais. Assumindo que influenciadores digitais são também marcas, mercadorias disponíveis para consumo – já que fazem parte de uma economia da imagem de si, do sujeito como commodity –, a pandemia mostrou que seus consumidores estavam fartos da aparente neutralidade de seus discursos.
Como pesquisadora, entender esse cenário de mudanças só foi possível a partir da leitura da primeira edição do livro Consumo de ativismo. A obra é capaz de tirar o leitor mais cético da análise excludente em que consumo e ativismo ocupam esferas diametralmente opostas. Em poucas páginas, Izabela Domingues e Ana Paula de Miranda mostram que pensar consumo versus ativismo é simplificar relações complexas e reduzir anseios da sociedade a bens de consumo triviais.
E, entre essas complexidades, peço licença para listar aqui cinco das quais elegi como principais aprendizados com a leitura de Consumo de ativismo e que me permitiram entender os novos dilemas da influência digital:
1. Consumo é também disputa. Manuel Castells, ao tratar dos movimentos sociais em rede, afirma que há diferentes formas de operar mudanças. Uma dessas formas é a coerção, a outra é a conquista da mente das pessoas. Se assumimos que consumidores são cidadãos, os valores cívicos, sociais e mesmo culturais suplantam os meramente materiais do consumo. Isso significa que consumir é também tensionar o poder vigente, disputar narrativas, construir significado. Afinal, o colapso das grandes instituições e a atomização dos sujeitos fez com que questões políticas dos cidadãos fossem respondidas no consumo: Quem sou eu? Como posso me informar sobre o mundo? Quais são meus direitos? Em que eu acredito? E essas questões passam a ser coletivizadas sob a cultura do consumo.
2. Há muitas formas de se fazer ativismo. O consumo de ativismo revela que as escolhas de consumo material não são meramente utilitaristas. Já não eram, mas essa premissa se escancara. Mais do que comprar uma camiseta com os dizeres girl power estampados, para o consumidor ativista importa também quem costurou essa camiseta, se há mulheres em cargos de liderança na empresa, se a cadeia produtiva é justa. Os consumidores podem não ser filiados a uma organização política, mas o consumo de ativismo é uma maneira de demonstrar adesões e apoio a causas, multiplicar discursos políticos, disseminar narrativas nas mídias digitais. E é por meio dele que muitos se veem, no fim, participando de movimentos sociais.
3. O digital é profícuo para o consumo de ativismo. A internet nos ofereceu um espaço descentralizado e democrático, a possibilidade de falar sem pedir licença a ninguém e a chance de observar bem de perto empresas e governos. Tudo isso é amparo para que o ativismo e o consumo se imbriquem. Sob o imperativo da transparência, as marcas correm riscos de ter