Paulo Freire busca colocar os oprimidos, as classes sociais subjugadas, no palco da história. Contudo, uma efetiva emersão como sujeitos históricos fica fragilizada, considerando que há uma incompletude: suas demandas continuam sendo, majoritariamente, trabalhadas por conhecimentos e práticas demandados pelos opressores. Na obra Extensão ou comunicação?, é frágil a compreensão de que conhecimentos e práticas hospedam valores. O silenciamento, a não problematização de valores funcionais ao capital, hospedados na tecnociência capitalista, constitui situação-limite nessa obra. Há uma incompletude. Incompletude teórica e inconclusão do ser humano, como processos históricos, caminham conjuntamente. Incompletude e inconclusão, associadas à humanização, demandam lutas políticas. Lutas iluminadas, sinalizadas por determinados valores.
Mais e mais, a dinâmica tecnocientífica global faz circular valores funcionais ao capital. Se a humanização, o ser mais, constitui vocação ontológica do ser humano, o seu contrário, a desumanização, também consiste em possibilidade histórica. Por exemplo, uma tecnociência cada vez mais empresarial, mercantilizada e privatizada, dinâmica relacionada à progressiva degradação socioambiental.
Práxis desenvolvida, pautada nos princípios da agroecologia, trabalhando incompletude identificada, contribui com sinalizações promissoras. Nela, a categoria freireana diálogo precisou ser alargada para diálogo de saberes, o qual é constituído de três campos que dialogam entre si: os conhecimentos produzidos historicamente, conhecimentos resultantes do enfrentamento de demandas ignoradas historicamente e a memória biocultural.
Duas novas categorias, em processo de amadurecimento, sintetizam a caminhada: coprodução e coaprendizagem. Sinalizam novos horizontes para processos produtivos e educativos. Nutrem-se do diálogo entre ambos. Diálogo entre agenda de pesquisa do oprimido e pedagogia do oprimido. O diálogo de saberes, a problematização freireana e os valores tornados prioritários constituem elementos que dinamizam, que organizam a coprodução e a coaprendizagem. Essas categorias expressam um novo inédito-viável no campo da produção de alimentos, a agroecologia.
Na obra Extensão ou comunicação?, Freire problematiza a extensão clássica, pautada em pressupostos tecnocráticos, propondo a comunicação mediante processos dialógicos e problematizadores. Sua robustez torna-a perene. Contudo, com elementos de hoje, a presente obra soma-se no sentido de trabalhar a incompletude identificada nela. Incompletude inerente a processos históricos, hoje, mais evidente, considerando a densificação de elementos empíricos e teóricos. Incompletude trabalhada que faz a presente obra avançar de comunicação para coprodução e coaprendizagem.