Em tempos apressados, de cotidiano recheado de excessos, supérfluos e descartáveis, onde tudo parece ao alcance das mãos ou dos olhos e em que se corre o risco permanente de reduzir pessoas a fragmentos eletrônicos que se tenta em vão organizar, escalonar ou mesmo apagar em aparelhos, a poesia recolhe ao centro de gravidade humano, traz alerta com suavidade, ressoa como voz familiar que interpela, reúne e realinha. A poesia como que nos chama pelo nome e nos coloca face a face com nosso real interior.
Diante de um espaço vazio, não há subterfúgio, camuflagem ou esconderijo possível, é o(a) autor(a) solenemente convocado(a) a registrar uma parcela de sua verdade, a tentar exprimir sentimento ou reflexão condensada, de modo a convencer alguém de que vale a pena parar um instante para perder ou para encontrar tempo em poucas palavras.
A poesia oferece ponto de encontro entre pensamento, estética e afeição: é a escrita refletida que se enfeita para a liturgia. O texto rimado remete a salmos e imprecações que habitam o plano sem limites do imaterial como expressão da consciência, exteriorização da experiência ou simples manifestação da vontade. Assim, conceito, arte e conselho podem vir a interagir em algumas linhas.
Em um poema todos podem se encontrar, todos podem ser iguais, tudo pode ser apresentado, recriado, refeito; quase tudo pode ser perfeito ou ter em si o belo que se instala mesmo na imperfeição, para que possa ser compreendido e contemplado.