Este modesto livreto reúne um conjunto de pequenos escritos: poesias, crônicas e contos escritos nos meus últimos dez anos de vida. Trata-se de textos rápidos, mistos, quase que uma esquizofrenia sem forma, pensados com pureza a partir do que via em vielas, bares, vilas, albergues, viagens, ruas e esquinas. Um livro que evoca a unção entre o real e o abstrato, a morte e a vida, a felicidade e o sofrimento, o dinheiro e a pobreza. Denuncia, antes de tudo, as desigualdades, as violências, as injustiças, as iniquidades e a incompreensão. Fala do chão, da terra, do barro, da poça. Valoriza as coisas pequenas, as coisinhas miúdas. Mas também fala de amor, de sentimentos, dos céus, do mar, das borboletas e das estrelas. Por tudo isso leva o nome de "Becos Emoldurados". O livro também é quase uma etnografia, pois meu fascínio por becos vêm de longa data. Quando migrei do interior para a capital Porto Alegre, depois de morar em um albergue para viajantes mochileiros, vivi dois anos em um apartamento localizado num beco clássico: estreito, curto e sem saída. Lá o mundo acontecia, a vida pulsava, as necessidades afloravam. Tinha uma dinâmica diferente do restante da cidade, um arranjo próprio. Lá circulavam estudantes, bêbados, empresários, professores, traficantes e trabalhadores. O beco causava medo e compaixão. Comprava-se e vendia-se. Negociava-se e vivia-se. Matava-se. O beco era apartado da cidade e emoldurado por luxuosos prédios centrais. E eu ficava na janela do meu quarto observando, atentamente, a vida livre e desprendida desse mundo cativante. Os textos também resultam de uma experiência de trabalho de dois anos que tive em outros becos, dessa vez em uma localidade que vive em extrema pobreza na cidade de Porto Alegre. Lá trabalhei como enfermeiro de família, e pude viver intensamente – e não só observar – a vida em beco. Eram milhares de pessoas à margem, vivendo miseravelmente as migalhas podres da sociedade. Esses becos também eram emoldurados por prédios luxuosos, que davam à cidade um ar mais harmônico (e hipócrita). Nesses dez anos, ouvi e contei muitas estórias, e todas que me sensibilizavam serviam de estopim para produzir uma escrita. Espero que o leitor reascenda toda a potência que tentei evocar ao escrever. São textos simples e com amor.