Dois amigos de infância, Vega e Moya, se encontram num bar, num final de tarde em San Salvador, América Central. O primeiro deles acaba de retornar à cidade, para o velório da mãe, após anos de autoexílio. Diante de seu interlocutor silencioso, revela toda a cólera e a indignação com o lugar onde nasceu e de onde, garante, preferiria manter distância. Sua revolta não poupa nada – da cerveja que os nativos costumam apreciar até o modelo de ensino – e vai crescendo numa escalada feroz. Asco se dá na forma de um relato que se desenvolve sem pausas, num único parágrafo, consolidando um texto de crueza perturbadora. Uma investida rara no fel que pode habitar a relação entre um homem e sua cidade.
Foi com essa novela singular que o hondurenho Horácio Castellanos Moya conquistou reconhecimento internacional, e é com ela que enfim estreia no Brasil. Foi também com este livro - publicado originalmente em 1997 - que recebeu ameaças de morte e muitas críticas em El Salvador, país onde cresceu, ao ter mostrado, na voz de Vega, algumas das mazelas que assolam o lugar. Hoje, porém, o título vem se tornando, pouco a pouco, objeto de culto pelos jovens daquele país.
Os méritos da obra extrapolam o conjunto de críticas sociais que expõe. Ao construir uma novela que se desenha inteira na reprodução de um relato oral – e, mais que isso, um monólogo furioso – Moya nos apresenta uma joia da literatura recente. Um texto que usa a linguagem coloquial, simples e direta – familiar – para esticar ao máximo a malha de perturbação que nasce nas contradições de uma nação. "O texto é um monólito, um jorro. Um desabafo que não pode ser interrompido", descreve Adriana Lunardi no posfácio do livro. E um engenho narrativo dos mais originais, onde a fúria do desabafo vai alternando diferentes velocidades, prendendo o leitor numa espiral vertiginosa e surpreendente.