Quando criança, minha família tinha por costume rezar o terço em torno da cama de meus pais, todas as noites. Minha mãe o iniciava e nós, incluindo meu pai, respondíamos. Para nos estimular, ao final, minha mãe contava histórias sobre Beppe, um menino muito esperto e muito pobre, que vivia com sua mãe na região da Toscana, em uma época não definida, mas com muitos contornos medievais. Eram histórias, advindas da tradição oral, que se passavam na região do Veneto, na Itália, de onde minha família se originava. Minha mãe as havia ouvido, nas mesmas circunstâncias, de seu pai, Giuseppe, que, da mesma maneira, as havia ouvido de seus pais. Estas histórias atravessaram o oceano, numa época de carestia e temor. No embalo do navio, para acalmar o medo e a fome, minha bisavó as contou para meu avô que, já no novo mundo, à luz da lamparina, as contou para minha mãe, que, noite após noite, as transmitiu a seus filhos, eu e meus nove irmãos. Hoje sei que foram estas histórias que possibilitaram que no nosso imaginário, não fossemos uma família pobre, mas uma família que lutava por reconquistar seu passado de grandeza. Em resumo, uma família unida, feliz e com um objetivo. As histórias versavam sobre Beppe e sua mãe, Lauretta, uma princesa renegada pelo seu pai, por ter tido esse filho com um plebeu, que viviam, juntos, mil aventuras. Na minha imaginação, eu era esse menino. E penso que ainda o sou. Guardei em minha memória, e muito mais em meu coração, estas histórias ingênuas, mas cheias de mensagens edificantes. À medida que minha filha Laura ia crescendo, eu as ia contando a ela. Sem o terço, óbvio. Hoje as transcrevo para que meu neto, José Vitor, desde sempre nosso Beppe, as possa desfrutar, como tantos antes dele usufruíram. E a dar continuidade a estas lindas aventuras.