Ar aberto é livro para ser lido a plenos pulmões, ainda que aos sussurros. Dureza de pedra e esperteza de vento, os versos de Mariana Paz vêm com força pulmonar, de suspiro fundo, muchocho ou tosse, como se expelissem, a cada lufada, o que há de venoso das palavras – e, na inspiração, limpam o ar, filtram, e expulsam o ruim. A poesia se faz pulmão.
Poemas-quase-haicais, pregam no tempo a matéria da palavra, mas, visto tão de perto, o movimento é dança. Fotografias ligeiras, haicais equilibrados entre o aéreo da metafísica e o concreto do concretismo (pedra, árvore e aliterações preciosas que soam ao longo do livro – "suprema penumbra", "deslize em cílio"). A poesia se faz corpo.
De um poema a outro, Mariana joga pedra-papel-tesoura, num jogo de pulso e palma da mão. Se a mão descansa "sobre qualquer resto/ qualquer beira", se a lua pode ser "pesada como uma mão sobre o papel", na alegria viva no inseto, "os casulos tecem-se à revelia das mãos". A poesia se faz gesto.
Sensual e sensorial, no encontro do ar com os pulmões, a poesia se acende o brilho quente do cigarro ("o que é o amor?/ um fogo crepita no fundo da voz"). E, no encontro, do respiro, da dança, do imperceptível movimento do ar – o ar aberto é também combustão: "a sorte é uma vela acesa". A poesia se faz chama.
Por Ana Lima Cecílio