Conto esta história porque preciso. Não é questão de capricho: não posso me arrancar deste conto — veja bem, sou peça central nele —, mas posso arrancar este conto de mim. É necessário que seja feito, como uma remoção de verruga, como uma cirurgia de irmão siamês, como amputação de um membro necrosado.
Nomes não são importantes. Tive tantos no decorrer de um ano que me parecem agora tão substituíveis quanto os sapatos que uso — repostos na medida em que se caminha, na medida em que se gastam, na medida em que se faz necessário. O Rio de Janeiro e seus arredores são o único palco a ser nomeado: mundo dentro do mundo, terra em si própria tão caricata que preserva o anonimato de todos os personagens.
O tempo também é flexível — líquido. Memória e história confundem-se na terra das ações e das paixões. A rememoração serve tanto na luta contra o esquecimento quanto no processo de superação do trauma: limpa a ferida, que deve ser completamente aberta antes da sutura final. Pois bem, aqui exponho esta ferida: contemplem! Rezo para que as flechadas que lancei em outras criaturas no decorrer desta fábula não tenham sido fatais.