O corpo sempre foi visto, ao menos desde o platonismo, em oposição à alma. O dualismo tradicional associa o corporal ao que é efêmero, corruptível e irracional, ao passo que entende a alma como o que há de constante e inteligente na identidade do homem. Heidegger, contudo, problematiza a definição usual do animal racional e propõe interpretá-la de modo novo e original, em que não se rivalizam como polos opostos a animalidade e a racionalidade humana. Sua compreensão da existência, portanto, rompe a dicotomia tradicional entre sensibilidade e inteligência, afetos e entendimento, corpo e alma. Para tanto, sugere pensar o corpo para além do corpo material, da fisiologia de ossos e tecidos, e o faz ver como corpo significado, corpo próprio ou ainda: corpo mundanizado. De fato, o corpo humano é "coisa nenhuma", isto é, não é uma coisa, mas um processo, não é um substantivo, mas um verbo: corporar. Assim sendo, não podemos reduzir nossa corporeidade à materialidade física, pois o corpo é sempre uma abertura de sentido. Ser gordo ou magro, por exemplo, não tem relação com o número indicado na balança, mas com o modo como cada um vive seu corporar. Ser masculino ou feminino, por sua vez, não diz respeito ao sexo no qual se nasceu, mas ao modo como o corpo próprio é sentido e significado. O corpo, por conseguinte, nunca é algo, mas sempre uma possibilidade aberta por cada mundo - cada existência corpora seu mundo, mundaniza seu corpo.