No contexto pós-colonial do século XIX, um período em que as recém-emancipadas nações sul americanas buscavam consolidar-se política e culturalmente, a imagem de Dante Alighieri cruzou o Atlântico, atravessou os trópicos e alcançou a parte sul das Américas. Seu espírito renovador veio compor o discurso nacional de parcelas significativas dos intelectuais e escritores do continente, em especial, na segunda metade do oitocentos, momento que coincide com o Risorgimento italiano.
Entre os letrados que tomaram emprestado a voz de Dante para somá-la ao seu próprio discurso sobre a construção de uma identidade para seus países, destacam-se o imperador do Brasil, Dom Pedro II, e o presidente da Argentina, Bartolomé Mitre. Ambos mantiveram com o poeta italiano uma relação que perpassou suas vidas e dele traduziram a Divina Comédia. A imagem do L'altissimo poeta construída pelos dois líderes, e por uma gama importante de intelectuais do período, foi o resultado do objetivo assumido por eles de construir símbolos e mitos que dessem sustentação a um projeto de consolidação da nação. Assim, o objetivo principal deste livro é buscar no processo criativo dos dois governantes-escritores indícios de intervenções para construir uma imagem de Dante que se somasse à narrativa que ambos articulavam para a consolidação político-cultural de suas nações. Examinando, assim, em que medida a imagem construída do poeta fiorentino foi um resultado das intencionalidades que perpassava o objetivo das suas escrituras.