Penúltimo texto de Oduvaldo Vianna Filho, Allegro desbundaccio, ou Se o Martins Pena fosse vivo (1973) se passa no Rio de Janeiro, mais especificamente num caótico apartamento onde se desenrola uma acelerada trama de encontros e desencontros. O núcleo da peça é constituído principalmente por três das personagens: Protético, um dentista homossexual vivendo no limite da sobrevivência financeira; Buja, um publicitário que, diante de seu senso moral, abandonou seu trabalho bem remunerado; e Teresa, que deseja casar-se com um homem rico, parte por pressão de sua mãe, mas acaba envolvida com Buja, que desistiu de seu salário de publicitário.
A peça revisita a comédia tradicional, não apenas pela mera marcação da tradição ao evocar Martins Pena, aclamado comediógrafo carioca do século XIX, em seu subtítulo mas também por se tratar do gênero o qual Vianna utilizou para dar forma a novos elementos que passaram a estar presentes na vida da classe média no Brasil, como o crescimento da indústria cultural e internacionalização, assim como o advento da Contracultura.
O retrato desses novos elementos da realidade brasileira já se inicia através do título da peça: desbundaccio remete a "desbunde", termo associado aos comportamentos e às opções existenciais de todos os que, no contexto da ditadura, identificavam-se com a Contracultura. Assim sendo, "desbundar" significava escolher o que havia de não convencional, abandonando os padrões de militância da esquerda inserida em tal contexto.